Quantos indicadores seu serviço de saúde acompanha? Se você trabalha em um hospital ou clínica de médio porte, a resposta provavelmente é "dezenas" — ou até "centenas". Paradoxalmente, quanto mais indicadores temos, menos sabemos o que está acontecendo.
O problema não é falta de dados. É excesso de dados sem critério. Dashboards lotados de números coloridos que ninguém olha, relatórios mensais que vão direto para a gaveta, reuniões onde todos concordam que "precisamos melhorar" sem saber exatamente o quê.
Este artigo propõe um caminho diferente: menos indicadores, mais ação. Baseado nos princípios do IHI e na experiência prática de gestão em saúde, vamos explorar como construir dashboards que realmente fazem diferença.
O paradoxo da medição
Peter Drucker nunca disse "o que não pode ser medido não pode ser gerenciado" — essa é uma citação atribuída erroneamente a ele. O que Drucker realmente acreditava era mais sutil: nem tudo que importa pode ser medido, e nem tudo que pode ser medido importa.
Na saúde, esse paradoxo é especialmente relevante. Podemos medir facilmente o tempo de espera, mas como medimos a qualidade do acolhimento? Conseguimos contar o número de procedimentos, mas como quantificamos o alívio do sofrimento?
"Measurement is not the goal. Improvement is the goal. Measurement is just a tool to help us know whether the changes we make are improvements."
— Lloyd P. Provost, Associates in Process Improvement
A primeira lição, portanto, é resistir à tentação de medir tudo. O objetivo não é ter o dashboard mais completo, mas sim ter o dashboard mais útil.
A família de medidas do IHI
O Institute for Healthcare Improvement propõe uma estrutura simples e poderosa: toda iniciativa de melhoria deve ter três tipos de medidas complementares.
1. Medidas de resultado (outcome measures)
São as medidas que respondem à pergunta: "Estamos alcançando nosso objetivo?" Representam o que realmente importa para pacientes e para o sistema.
- Taxa de mortalidade em UTI
- Taxa de readmissão em 30 dias
- Satisfação do paciente
- Tempo até diagnóstico definitivo
Medidas de resultado são importantes, mas têm uma limitação: mudam lentamente. Se você só acompanha resultados, pode demorar meses para perceber que algo deu errado.
2. Medidas de processo (process measures)
São as medidas que respondem à pergunta: "Estamos fazendo o que planejamos?" Representam as etapas intermediárias que levam ao resultado.
- Percentual de pacientes com profilaxia de TEV administrada
- Adesão ao checklist de cirurgia segura
- Tempo entre solicitação e resultado de exame
- Taxa de higienização das mãos
Medidas de processo são mais sensíveis a mudanças. Se você implementou uma intervenção na segunda-feira, pode ver o efeito no processo já na terça.
3. Medidas de balanceamento (balancing measures)
São as medidas que respondem à pergunta: "Estamos causando problemas em outros lugares?" Garantem que a melhoria em um aspecto não está prejudicando outro.
- Ao reduzir tempo de internação: taxa de readmissão
- Ao aumentar produtividade: satisfação da equipe
- Ao reduzir custos: eventos adversos
- Ao acelerar atendimento: completude da avaliação
Regra prática
Um bom dashboard de melhoria tem entre 5 e 8 indicadores: 1-2 de resultado, 2-4 de processo, e 1-2 de balanceamento. Mais do que isso dilui a atenção.
Critérios para escolher indicadores
Nem todo indicador merece espaço no seu dashboard. Antes de incluir uma medida, faça estas perguntas:
1. É acionável? Se o indicador piorar, você sabe o que fazer? Indicadores que geram apenas preocupação, mas não orientam ação, são ruído.
2. É sensível à mudança? O indicador consegue detectar as mudanças que você está fazendo? Indicadores muito agregados ou com ciclos longos não servem para gestão do dia a dia.
3. É confiável? Os dados são coletados de forma consistente? Indicadores com definições ambíguas ou coleta irregular geram mais confusão que clareza.
4. É relevante para quem vai usar? O indicador faz sentido para a equipe que vai acompanhá-lo? Métricas impostas de cima para baixo raramente geram engajamento.
Exemplo prático: dashboard de pronto-socorro
Imagine um pronto-socorro que quer melhorar o tempo de permanência dos pacientes. Um dashboard focado poderia ter:
| Tipo | Indicador | Meta | Frequência |
|---|---|---|---|
| Resultado | Tempo médio de permanência no PS | < 4 horas | Diária |
| Processo | Tempo porta-médico (triagem ao 1º atendimento) | < 30 min | Diária |
| Processo | Tempo decisão-leito (alta/internação) | < 60 min | Diária |
| Processo | % exames com resultado em < 2h | > 90% | Diária |
| Balanceamento | Taxa de retorno em 72h | < 5% | Semanal |
| Balanceamento | Satisfação do paciente | > 80% | Semanal |
Note que são apenas 6 indicadores. Cada um tem um propósito claro e uma meta definida. Se o tempo de permanência aumentar, a equipe sabe exatamente onde investigar: porta-médico, decisão-leito ou exames.
Visualização que gera ação
A forma como você apresenta os dados é tão importante quanto os dados em si. Algumas diretrizes baseadas em evidências de visualização:
Use run charts, não tabelas. O cérebro humano processa padrões visuais muito mais rápido que números em colunas. Um gráfico de linha mostra tendência instantaneamente; uma tabela exige análise.
Mostre a meta visualmente. Uma linha horizontal indicando a meta permite comparação imediata. O olho vê se você está acima ou abaixo sem precisar ler números.
Destaque o que precisa de atenção. Use cor com propósito — vermelho para indicadores fora da meta, verde para os que estão bem. Mas use com moderação: se tudo é destaque, nada é destaque.
Inclua contexto temporal. Um número isolado não diz nada. "87% de satisfação" é bom ou ruim? Depende: era 92% no mês passado? Era 75% há um ano? Sempre mostre pelo menos 12 pontos de dados para permitir análise de tendência.
O ritual mais importante
Um dashboard perfeito que ninguém olha é inútil. A ferramenta mais poderosa da gestão por indicadores não é tecnológica — é comportamental: a reunião de revisão.
O IHI recomenda reuniões curtas e frequentes (daily huddles) onde a equipe revisa rapidamente os indicadores-chave. Não para julgar ou punir, mas para aprender e agir.
Três perguntas orientam essa revisão:
- O que os dados estão nos dizendo? Há tendências? Pontos fora do padrão? Mudanças recentes?
- O que pode estar causando isso? Hipóteses baseadas no conhecimento da equipe.
- O que vamos fazer? Ações específicas, com responsável e prazo.
Essa disciplina — olhar os dados regularmente, questionar o que significam e decidir o que fazer — é o que transforma números em melhoria.
Dica final
Comece com menos indicadores do que você acha necessário. É mais fácil adicionar depois do que remover. Um dashboard enxuto que é usado diariamente vale mais que um painel completo que é ignorado.
Conclusão: medição a serviço da melhoria
Indicadores não são o objetivo — são o caminho. O objetivo é cuidar melhor dos pacientes, usar melhor os recursos, trabalhar em ambientes mais saudáveis. Os números existem para nos ajudar a saber se estamos progredindo.
Um bom dashboard é como um bom mapa: mostra onde você está, para onde quer ir, e os principais caminhos. Não precisa mostrar cada árvore da floresta — precisa mostrar a trilha.
Na Aulus Tech, acreditamos que a tecnologia deve simplificar a gestão, não complicá-la. Por isso, nossas ferramentas são desenhadas para destacar o que importa e esconder o ruído — porque o tempo do gestor de saúde é precioso demais para ser gasto interpretando dashboards confusos.